O Medo Infundado da Morte

- Kleber Monteiro -

Quando me curvar para o túmulo, não direi como tantos outros:terminei minha jornada. Não, a sepultura não é um beco sem saída, é uma avenida; ela se fecha no crepúsculo, ela se reabre na aurora.” (Vítor Hugo)

 O medo da morte é um dos maiores medos da humanidade. É bem possível que isso se justifique tanto pelo sentimento instintivo de preservação da vida, quanto pelo aspecto cultural, em que a morte se afigura em uma caveira de capuz negro e foice pronta para por fim a tudo o que somos, a toda história, a toda vivência que construímos.

É claro que não se pensa a morte do mesmo modo em todos os tempos e povos. Nas culturas mais antigas, o mais comum era ver a morte como um símbolo de transição, de passagem para uma outra vida.

Com o progresso da ciência, esse horizonte de compreensão da vida após a morte ficou relegado à religiosidade, ao misticismo, cuja função seria obscurecer a razão e evitar um confronto com a realidade de que tudo acaba com a morte. Desse modo, a crença em vida após a morte é só uma forma de mitigar as nossas dores, o medo da finitude.

Muitas são as experiências humanas que nos fazem pensar a morte como a velha metáfora da transição, da travessia para o outro lado do oceano (no dizer dos índios guarani do litoral paulista e fluminense), mesmo a contragosto da “verdade” do que é entendido como real para muitos cientistas. Esse é o caso da experiência de quase morte, que acontece em toda parte e independe de crenças.

Pessoas que “voltaram” após serem consideradas clinicamente mortas, aquelas que chegaram muito perto da morte e aquelas que antes de morrer contaram um pouco de suas sensações enquanto agonizavam, costumam falar que viram como é morrer.

Para a maioria, morrer não é o fim. Quando uma pessoa sente que vai morrer e, de fato, morre, podem estar presentes as seguintes ocorrências:

1 – Sensação de estar fora do corpo;

2 – Visão de toda a vida de forma muito rápida e intensa;

3 – Travessia simbólica (a passagem por um túnel é o mais comum);

4 – Visão de outras pessoas “mortas”;

5 – Regressão de memória;

6 – Visões do futuro.

O interessante é que as nossas referências culturais determinam a percepção de como é morrer. Elisabeth Kübler-Ross fala do quanto, em experiência de quase morte, seria “improvável que uma criança judia visse Jesus. Uma criança protestante não veria Maria. Não que elas não se importem com essas crianças, mas simplesmente porque sempre obtemos aquilo de que mais precisamos. Aqueles que encontramos são os que mais amamos e nos precederam na morte.

Depois que nos encontramos com aqueles que amamos e com os nossos próprios guias e anjos da guarda, passamos por uma transição simbólica, frequentemente descrita na forma de um túnel, de um rio ou de um portal. Cada um vai escolher o que lhe é mais simbolicamente apropriado. Na minha própria experiência pessoal, era naturalmente uma passagem em uma montanha, com muitas flores silvestres, simplesmente porque o meu conceito de céu inclui montanhas e flores silvestres, fonte de muita felicidade em minha infância na Suíça. Isso é culturalmente determinado.” (O Túnel e a Luz)

Ao contrário do que se costuma dizer, nem todos veem a chamada luz no fim do túnel. Uma amiga que sofreu uma parada cardíaca e chegou a estar “morta” contou que apenas teve uma visão de toda a sua vida e identificou o seu pai, que a precedeu na morte, próximo ao seu corpo. Ela não morreu, mas experimentou um pouco da sensação de morte. O fato é que não há regras absolutas e situações idênticas para todas as experiências, apenas a certeza de que morrer não é o fim.

Contudo, para quem se aproximou, chegou e ultrapassou as fronteiras da morte, é generalizado o sentimento de que a vida é uma dádiva e precisa ser cuidada a todo instante. E saber cuidar, é saber amar. É por essa razão, e de forma muito feliz, que Elisabeth Kübler –Ross afirma: “As pessoas que vivem plenamente nunca terão medo de viver nem de morrer” (O Túnel e a Luz).

 



 

 


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